Por Adri Coelho Silva
Eu nunca fui tão fã de Silvia Pfeifer como sou hoje. E você vai entender o porquê. Aos 64 anos, atriz foi um dos destaques da mais recente semana de moda de São Paulo, a SPFW. Mas isso não é tudo. Pelo que pude perceber em algumas trocas com a atriz, trata-se de uma mulher que escuta, gentil, articulada, descompromissada com verdades absolutas e comprometida com o respeito ao próximo. E ainda ativa, interessante e interessada na vida. Tem um programa na www.bpmradio.com.br , o SONS E POESIAS, em que faz leituras de poemas de um jeito que só ela sabe fazer. É bonito. A atriz tem um olhar para a vida que é leve, corajoso e elegante. Além do talento que já conhecemos bem.
Se ela está de volta às passarelas? Ela responde: ”Por mais que eu volte a trabalhar como modelo — e existem várias mulheres e homens que trabalham como modelo aos 50, 60 e até 70, mais na Europa e nos Estados Unidos do que aqui — a minha profissão, o carro chefe ,vamos dizer assim, é ser atriz”.
E continuou: "Isso não quer dizer que eu também não possa ser modelo. Mas (agora) foi “revival”.
Fotografar e desfilar, é como andar de bicicleta, a gente não perde totalmente o que já soube, mas falta um pouco mais de prática (…) dá frio na barriga, dá nervoso, e faz parte. Acho que fiquei menos nervosa pra me colocar na passarela, mas eu fiquei mais preocupada, talvez com o andar e o salto, coisas que não são mais o meu habitual”, completou a atriz, de quem sou muito fã.
Não foi primeira vez que falei com a atriz. Minha “estreia” com Silvia foi no final do ano passado por intermédio da Soninha Gonçalves, assessora de imprensa querida, competente e muito amiga da atriz. O Jeff Ares fez o link e tudo se deu: conversamos longamente e com total sinceridade sobre idade, filhos, solteirice na maturidade, beleza, enganos e vontades. Está tudo abaixo, só conferir.
Como que você definiria o envelhecimento?
Dizem que devia ser uma arte, né? E acho que, saindo dessa coisa de arte, envelhecer é muito um estado de espírito. Vejo que a gente (nossa geração) está conectada pela forma que escolhemos cuidar do envelhecimento, por escolher envelhecer bem, com consciência, sabendo que a gente PODE! Hoje sinto um frio na barriga, que antigamente não tinha, porque a gente já não tem mais tanto tempo pra fazer muita coisa que a gente gostaria. E, daí, acho que a gente se determina a fazer as coisas que são possíveis e isso é uma escolha importante no nosso processo de amadurecimento. Você pisca, passou. E temos essa consciência. Eu, que nunca fui uma pessoa dedicada aos projetos pessoais, estou meio que correndo atrás disso.
Como você via o envelhecimento quando você tinha 20 e poucos anos, 30 anos? Como é que era isso?
Eu acho que eu nunca parei para refletir, para filosofar sobre a velhice. Talvez porque eu venha de uma família com longevidade saudável. Minha mãe tem 99 e não aparenta a idade que tem. Meus irmãos não aparentam a idade que têm. Então, tem uma coisa genética bastante forte. E, além disso, como sempre trabalhei desde os 19 anos, como sempre vivo de maneira muito corrido, a vida me ensinou a viver um dia de cada vez. Os primeiros questionamentos do envelhecimento começaram uns 10 anos atrás, quando percebi, "Opa, o ritmo já não é mais o mesmo, o corpo também não”. De uns tempos pra cá, eu acho que mais perto dos 60, começou a me vir essa noção e a vontade de falar do tempo disponível que eu tenho para realizar as coisas que quero. Com o agravante de que a pandemia me trouxe a preocupação de não conseguir, talvez, realizar as coisas na velocidade que eu gostaria. Mas eu vou conseguir. Não dá mais pra pensar no que foi, no que ficou lá atrás.
E no mercado de trabalho…a idade "pesou" para você ?
Eu acho que o peso da idade existe, o etarismo também. E curioso: deveria ser o contrário: quanto mais experiência, melhor o profissional. Hoje existe uma demanda muito forte por atualização também — e não só no meu segmento de trabalho. E essa demanda talvez ñao acompanhe o ritmo de quem é mais velho. De toda forma, também penso que alguém experiente e atualizado deveria ser mais valorizado, indiferente a profissão, e não é.
Já aconteceu de você ver no hoje uma foto sua de quando era mais nova e pensar: gente, eu tava ótima! Que boba eu era, como podia enxergar tanto defeito em mim?
Eu não achava eu eu estava “ruim" e não acho que estou ruim agora, mas sei que está diferente do que já foi (risos). Mas já me peguei olhando fotos minhas, do passado, e pensando: ”Poxa vida, olha só, eu …eu não me valorizei, né?"
Que conselho você daria Silvia de 35 anos atrás?
Diria para ela viver tudo o que quiser viver e com muita honestidade interna. Diria isso porque é o que eu estou buscando na minha vida. Diria para ficar mais atenta a certos aspectos, aprimoramentos, diríamos assim, culturais. Diria que quanto mais ela se preencher internamente, melhor. Diria para não se prometer, nem projetar tanta coisa. Eu acho que quando a gente fica projetando demais e explicando demais, acaba se frustrando demais em algumas coisas. De maneira geral, olhando para trás, eu acho que eu sempre tive medo de muita coisa, mas eu acho que eu sempre enfrentei muita coisa, mesmo com medo.
Qual que você acha que é o maior mal entendido, o maior engano relacionado à velhice?
Maior engano… o engraçado dessa pergunta é isso, não é só sobre o engano, mas sobre o maior dos enganos. (risos).
Sim porque são muitos os enganos, né?
É verdade. Eu acho que cada um tem que viver a realidade da forma que quer, da maneira como se sente bem. Tenho aprendido muito com essa diversidade, esse pluralismo de hoje em dia , que é muito bom pra cortar os nossos próprios preconceitos. Então vou usar a palavra TALVEZ e a expressão PODE SER. Talvez o maior engano seja o de acreditar que “retoques” estéticos (procedimentos e cirurgias) possam deixar uma pessoa mais bonita que o natural, ou melhor, que o exagero deles seja a solução. Eu acho que esses cuidados podem ser mais sutis. Outro engano grande pode ser o de querer ficar num comportamento quando aquele comportamento já não cabe mais no seu hoje, sabe? Mas reforço: entra aí o meu julgamento, que diz muito sobre mim. O julgamento é muito destrutivo, muito particular, sobre quem julga — e não leva a lugar nenhum. Então, cada vez mais eu fico prestando atenção no meu julgamento. E sei que não devemos ficar preocupados com os julgamentos dos outros
Se eu pedisse para você escrever agora uma carta para você de 80 anos, o que diria?
Eu gostaria de ler "poxa, você conseguiu chegar melhor até aqui bem melhor do que eu esperava! Que bom, que bom você estar aqui, você ter conseguido realizar suas metas, que bom que você possa se sentir bem, entrar bem nessa nova fase. Tomara que você continue aproveitando. Tomara que ainda tenha projetos, ainda tenha vontades, porque enquanto a gente tiver desejos, teremos vida” Escreveria isso. Eu acho que esse trajeto daqui até os 80 é aquele que ainda é possível produzir, criar. Não que não se possa produzir com 90. Claro que dá, mas é mais difícil. Então, eu acho que daqui da minha idade até 80 dá pra fazer muita coisa, e tem muita gente que nos traz exemplo exemplo.
Filhos e maturidade, como vem sendo?
Eu acho que a juventude, a jovialidade do filho, pode nos alimentar bem. Minha filha tem 37, meu filho tem 29 anos. Eu tenho que me colocar num outro lugar, já não posso mais exigir certas coisas, é mais uma relação de amigo. Por um lado, sinto falta daquilo que éramos, por outro celebro a liberdade que temos, e não me engano: filho vai ser filho a vida inteira. Então assim, a mãe vai estar sempre aqui para poder alertar sobre certas coisas, trocar ideias, apoiar com força e incentivar também.
E como a solteirice na maturidade?
Ah, é diferente. É boa. Como fui casada por muito tempo, desde jovem até recentemente, está sendo uma descoberta e um momento muito interessante de autoconhecimento e conhecimento. A gente só tem ideia do que como as coisas são quando realmente as vivemos.]
E entendo que tenho que curtir o momento, saber curtir o momento, nem ficar pensando muito mais adiante…porque você já não tem tanto tempo pra esperar para que aconteça lá na frente.
Eu vi o seu post com a Karin, que foi sua colega de quarto quando você morou em Paris para desfilar — e são amigas até hoje. Me conta sobre amizade? Ao longo da vida para você, qual é o valor das amizades ai?
Olha, eu entendo que afeto é a coisa mais importante. Eu não estou falando de amor, de paixão, de casamento, mas de afeto. Há o hábito de olhar para vida pessoal e profissional, enquanto a vida social também diz muito sobre quem somos. Eu conheci a Karin quando eu tinha 21. Era a minha primeira viagem à Paris e acabei dividindo o quarto do hotel com ela e a gente ficou amiga desde então. Veja: na época eu não falava inglês, e ainda assim nos comunicávamos e nos demos muito bem. A partir daí, participamos de alguns momentos importantes da vida da outra presencialmente, mas como ela mora na Itália, ficamos também longo períodos sem nos ver. Contudo, não importa o tempo que a gente fique sem se ver ou sem se falar, quando a gente se encontra é um sentimento tão forte, é um carinho tão, tão forte. Eu acho que é um presente da vida: eu saber que eu posso contar com uma amiga e que ela pode contar comigo. A carreira de modelo me trouxe boas amigas, além da Karin, conheci a Betty Lago e a Carla Souza Lima, que já faleceram…e a Thereza, a Patrícia , a Lula, a Montanarini, a Nina que ainda são amigas muito importantes para mim.
Vamos falar da Silvia modelo também? Como que foi o seu retorno para as passarelas e quanto tempo você ficou longe dos desfiles, hein?
Tudo aconteceu casualmente. Eu fui fazer um ensaio fotográfico e me levaram uma roupa da marca Neriage . Depois, fui apresentar um evento em Belo Horizonte, e de novo me levaram uma roupa da marca. E eu gostei muito das roupas, do caimento, de tudo. Aí eu aconteceu que eu estaria em São Paulo na data do desfile da Neriage, e a Soninha Gonçalves, que faz a assessoria de imprensa da marca, me convidou para assistir o desfile — e adorei a ideia e confirmei na hora. E eis que depois de um tempo ela (Soninha) me ligou : por que você não participa do desfile? Na hora respondi, ‘É claro, acho as roupas da marca incríveis’. Estar ali, naquele metiê, me trouxe boas lembranças. E mais: me trouxe fortalecimento. Depois desfilei para o Robert Dognani, na Casa dos Criadores. Adorei ver as modelos ali, todas excitadas para a passarela, e logo entrei na mesma vibração, sentindo logicamente um friozinho na barriga, mas não sentindo a responsabilidade que eu tinha quando eu era modelo. Porque eu não sou modelo, eu fui modelo, e não vou deixar de ser atriz para ser modelo, como também não vou deixar de passar por uma porta que me foi aberta, não é? E sabe: quanto mais pessoas maduras estiverem nesse meio da moda, melhor e mais interessante será.
Eu gosto muito e celebro esse movimento na moda internacional. Adoro ver mulheres de diferentes idades e corpos nas passarelas, campanhas e editorias de moda. Especialmente as 50+, é claro, porque a representatividade e a diversidade fazem sim toda diferença — e é linda.
Exatamente! É linda, é lindo. Esse movimento todo que está acontecendo de pluralidade na moda, nos filmes, nas artes e na televisão…tudo isso abre a nossa cabeça.
Silvia, como a gente conhece bem demais sua carreira como atriz, vou seguir na moda: quais os três pontos altos da vida profissionalismo modelo?
Ahn, alguns desfiles que eu fiz na Europa para grifes conhecidas. Na Itália eu trabalhei muito com o Armani, então isso foi muito importante na minha vida, na minha carreira. Eu fazia várias coisas para ele, fazia press release, fazia desfile, fazia as provas de roupa para os desfiles. Eu não cheguei a fazer campanha dele, mas era bem presente no dia a dia da marca. E foi muito interessante trabalhar com os vários estilistas e fotógrafos brasileiros da minha geração, como o George Henry e o Miro, por exemplo. Vou ultrapassar os 3. Vamos para 5? Porque também adorei as muitas matérias que eu fiz para a Vogue com a Regina Guerreiro, e também para o caderno "Ela" no O Globo, que até hoje tem uma linguagem bastante interessante.
Muito legal! Você nasceu em Porto Alegre, como eu. E aí morou no Rio, Brasília, Paris, Lisboa… como essas experiências estão em você, na sua personalidade até hoje?
Ninguém se torna melhor por ter morado no exterior ou em qualquer lugar — mas essas experiências mexem com você, no sentido de abrir a sua cabeça ao conhecer a maneira com que outras pessoas se relacionam com o espaço e com a vida. Eu trabalhei como modelo fora e foi de ralar, bater na porta, me colocar a teste diariamente. Eu morei em apartamento, flat e em hotel mesmo, hotel desses que não tinha banheiro no quarto. Tinha que me virar Quando você se vê fora do seu habitat, fora do seu ninho, é como se você não tivesse totalmente protegido. Então, tive que criar, encontrar ferramentas em mim para solucionar qualquer problema, qualquer questão que eu tivesse ou enfrentasse. E importante: isso não quer dizer que uma pessoa que não tenha vivido isso não encontre as ferramentas. Cada um encontra de uma forma. Só a real experiência potencializa essa questão de saber que você pode contar com você, mais do que com qualquer pessoa.
Muito legal. E sobre o futuro: o que você pode contar?
Existem planos em andamento, mas prefiro falar do presente, do hoje, do que é real: eu estreei um programa numa rádio digital, a BPM chama-se SONS E POESIAS, e nele recito poesias entre músicas. É um projeto que me faz e me faz muito bem, nasceu no pico da pandemia, quando eu não estava conseguindo me concentrar em leituras, que sempre gostei e que sempre me fizeram tão bem. Estava muito ansiosa, e o projeto me reaproximou da poesia, da leitura.
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